Há um ano ele se
despediu da minha mãe como um dia qualquer. Fez os planos de
encontrar sua amada na volta do trabalho. Saiu carregando a
felicidade de estar com seu sonho realizado. Levando na bagagem as
expectativas de um garoto de 20 anos. Mas no meio do seu caminho
havia um asfalto molhado, um trânsito alucinante. Nas suas mãos
havia uma moto que foi a responsável por interromper seus planos.
Agora no meio do nosso caminho há um pedra.
Eu cheguei lá e ele
estava bem diferente da última vez que o vi com vida. Dessa vez ele
tinha aparelhos que o mantinham ali. Mas eu sabia que não tinha mais
vida. Eu observei tudo em volta, toquei nele. Em pensamentos eu dizia
que queria que aquilo tudo não estivesse acontecendo. Eu pedia para
que ele voltasse. Mas eu sabia que não adiantava mais nada!
Tudo o que eu queria
era que o médico chegasse logo, para me dizer quais seriam os
procedimentos e eu sair logo daquele ambiente. Era a primeira vez que
eu entrava em UTI depois dos sufocos que já passamos com a Ana Rosa
em uma.
O médico veio e falou
tudo que deveria ser feito. Eu escutava mais ou menos, o que eu
pensava de fato é que eu teria que sair daquela sala e a primeira
pessoa que encontraria seria meu pai, a quem eu teria de dizer que
seu filho mais novo, seu pupilo tinha morrido.
Quando saí da sala dei
de cara com meu velho. Pálido, tremendo. Com uma esperança de que
eu dissesse que não tivesse chegado o fim. Mas eu não sou da fazer
rodeios, não sei enrolar muito nessas horas. Mas como eu não
chorava, ele até esboçou um sorriso.
Eu cheguei bem perto, o
abracei e soltei: Ele não sobreviveu! Sentei com meu pai em um banco
que parecia nos chamar para ele, dei uma olhada em volta e chamei
meus outros irmãos, que já vinham em prantos.
Então fui para a
segunda etapa mais difícil: Falar com minha mãe. Também foi tenso.
Era tudo tão inesperado. Mas eu não poderia ser frágil naqueles
momentos. Já estavam todos muito desestabilizados. Eu precisava me
manter firme para ajudar meus pais e meus irmãos. Eu pensava
friamente que meu irmão mais novo, a quem eu ajudei criar estava
morto e que não havia nada que eu pudesse fazer para mudar isso.
Tudo que eu tinha que fazer era ajudar quem precisava de mim dali
para a frente. Eu sou mãe e acho que morreria junto com a Ana Rosa
se algo assim acontecesse com ela. Então me doía pensar o que minha
mãe sentia.
Quisera eu demais estar
sonhando, que tudo aquilo fosse apenas um pesadelo. Mas como não
era, enfrentamos os trâmites burocráticos. Aconteceu o velório. O
velamos durante a noite e na primeira hora para o enterro ele foi
sepultado. Nós decidimos não prolongar o inevitável, não
queríamos ficar mais tempo que o necessário vendo uma fisionomia
que não era a que estávamos acostumados, não queríamos ficar
tocando aquele corpo gelado.
O tempo passou
rapidamente. Eu sinto a mesma dor que há 12 meses. Sinto falta dele.
É difícil ir na casa da minha mãe e não lembrar dele, não falar
das suas “artes”, não ficar tentando entender os porquês. Mas
não podemos parar porque a nossa vida segue e nós que ficamos vivos
precisamos continuar lutando.
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